quarta-feira, 16 de junho de 2010

E sereis como deuses...


O primeiro pecado das religiões judaico-cristãs não ficou restrito ao seu tempo e espaço, o mesmo atravessa toda a história humana estando fortemente presente na sociedade atual.


A narrativa do pecado original pode ser tida como um mito, mas a preciosidade e a contribuição que esse texto traz para as pessoas não está em sua veracidade histórica e sim na percepção que o autor sagrado teve do comportamento humano. O pecado original não está apenas na queda de Adão, mas é o primeiro passo para a queda de muitos homens e mulheres em suas diferentes dimensões, afetiva, familiar, profissional, etc.


"E sereis como deuses", esse trecho demonstra claramente a vontade que está enraizada no homem, depender unicamente dele mesmo, ter todas as situações sob o seu controle. Característica essa muito incentivada pela cultura "New Age" na qual cada pessoa é capaz de realizar tudo aquilo que ela acredita poder fazê-lo e as suas limitações não tem a compreensão e abordagem adequada para que se tenha uma psique sadia.


Não se trata apenas de afirmar que não se deva buscar sempre ser um ser humano melhor, a melhoria deve ser constante, mas não se pode esquecer que existem limites, pontos dos quais os seres humanos não podem ultrapassar e mesmo naquilo que cada pessoa já está devidamente preparada para realizar, seja profissionalmente ou pessoalmente, o erro, a falha serão sempre fantasmas que as acompanharão. Se o erro, a queda é inerente ao ser humano, querer ser como um deus é uma utopia, um ponto inatingível.


A segunda parte da motivação da serpente para que Eva coma o fruto proibido é que ela seria "conhecedora do bem e do mal", esse é outro ponto que está claramente presente no mundo atual. Quantas pessoas acreditam saber o que é correto se fazer em uma determina ocasião e ignoram todos os conselhos ou mesmo as normas já existentes?


Problemática essa muito presente, por exemplo, no seio da Igreja Católica onde vários padres se conferiram o direito de poder modificar os ritos fazendo o que acreditam ser o melhor, mas sequer fazem idéia das conseqüências que esse fato tem sob os crentes.


"O rito é um movimento em e para a profundidade. Os ritos não são inventados; são encontrados, descobertos, vivenciados e surgem a partir do encontro arquétipo com o profundo."¹ O grande problema que os sacerdotes católicos, tido como modernistas, podem inserir na psique dos fiéis católicos é a retirada da profundidade do sentido da existência humana. Com gestos e atitudes que visam apenas o ser fisiológico se esquecem que não basta apenas suprir as necessidades do corpo ou mesmo provocar descargas hormonais para que gerem sensações prazerosas.


Quando o ser humano vivencia o rito essa condição "traz paz e é isto que confere o único significado à vida humana."² Viver o rito é retomar o encontro com o Si - mesmo, com Deus. Um simbolismo que remete a um fato passado, mas que proporciona um encontro no presente com a nossa realidade transcendente.


Porém, "repetidos, os ritos perdem a capacidade de apontar para além de si mesmos."³ A vivência do rito não pode ser uma vã repetição4, sendo o rito um movimento em e para a profundidade quando o mesmo é vivido traz consigo sempre algo de novo. Isso faz com o rito sempre seja um novo encontro, para quem vive o rito católico, comungar não é sempre a mesma coisa, o ofício divino não é sempre igual, a liturgia não é apenas uma vã repetição é sempre um novo encontro com Deus.


É imprescindível saber discernir o certo do errado, ser "conhecedor do bem e do mal", porém o erro, o pecado, é quando o critério é subjetivo. O que pode garantir que avaliação seja sempre correta? Que quando se crítica ou se propõe modificar algum ponto, algum rito do homem, da sociedade ou da Igreja foi realizado um julgamento justo?


Questões difíceis que demandam muitas linhas para que se tenha uma resposta razoável, mas que me proponho fazê-la no próximo artigo. Entretanto, para aqueles que tem fé em Cristo Jesus, não é necessário se delongar nessa questão já que Cristo é o modelo do homem ideal e a sua regra é o amor.


¹ James Hollis, Sob a sombra de saturno, p. 23
² Ibid., p. 23
³ Ibid., p. 23
4 Mt 6, 7

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